Por Licurgo Nunes Quarto
Monsenhor Caminha, Cônego Caminha, ou simplesmente Padre Caminha, qualquer que seja o título honorífico eclesiástico que lhe seja dado, retrata muito bem o carinho e a dedicação que os pauferrenses ou alto-oestanos dedicaram a esse homem que tão bem representou a Igreja de Cristo, e que com tanta sabedoria orientou o rebanho da Igreja Católica, durante cinco décadas.
Filho de Ciríaco Alves e Luzia Freire, nasceu na Cidade cearense de Ereré, a 05 de julho de 1908.
Aprendeu a ler na sua cidade natal, tendo a sua mãe como a sua primeira Professora.
Seguiu para Fortaleza, onde cursou o seminário, ordenando-se Sacerdote, ungido pelo Bispo Dom Manoel da Silva Gomes, a 30 de novembro de 1933.
Foi vigário de Pacoti e Limoeiro do Norte, ambos no Ceará, e, a pedido de Dom Jaime de Barros Câmara, primeiro Bispo de Mossoró, foi transferido para a Diocese de Mossoró, sendo designado Vigário da Paróquia de Pau dos Ferros.
Em 28 de fevereiro de 1940, chega a Pau dos Ferros o então Padre Manoel Caminha Freire de Andrade, com 32 anos de idade, para dirigir uma das maiores e mais abrangentes paróquias da Diocese de Mossoró.
“Cheguei na sede desta Paróquia no dia 28 de fevereiro de 1940 e tomei posse, solenemente, no dia 03 de março deste mesmo ano, por ocasião da primeira missa paroquial ou conventual, celebrada às 10 horas da manhã. No meu primeiro sermão ao povo, dirigi-lhes palavras de saudação e exortação, pedindo a sua cooperação para poder levar, com proveito da coletividade, a minha missão divina até o dia em que a vontade do Divino Criador queira dar a outro o meu lugar” (Pe. Caminha – livro de tombo paroquial nº 03, pág. 08 ).
Muito inteligente, eloqüente e culto, bom orador, suas homilias, sempre foram marcadas pelo ensinamento da doutrina cristã, quando enfatizava a prática da caridade, da humildade, do amor ao próximo e a Cristo.
Inaugurou uma nova era na maneira de evangelizar o seu povo, bem como iniciou uma verdadeira revolução na construção de obras físicas na paróquia. Angariou, de pronto, a admiração e o respeito dos paroquianos, que começaram a se integrar à nova metodologia de administrar os destinos da paróquia.
E, neste sentido – o de integrar os paroquianos à Igreja, criou inúmeras associações religiosas, tais como: Congregação das Filhas de Maria, dos Vicentinos, Associação das Mães Cristãs, Associação Mariana para jovens, Cruzada Eucarística para as crianças. Esta última, além de promover e propiciar logo cedo às crianças a formação religiosa, tinha também como objetivo o envolvimento às atividade da igreja, como coadjuvante nas celebrações dos atos litúrgicos.
Foi o responsável direto para a chegada a Pau dos Ferros das Irmãs de Caridade da Ordem de São Vicente de Paula. Além de administrar o Patronato Alfredo Fernandes, as referidas Irmãs de Caridade auxiliavam nas funções de evangelização e catequese da Paróquia.
A festa da Padroeira – Nossa Senhora da Conceição – a 08 de dezembro - sempre foi “a menina dos olhos” do Padre Caminha. Na festa, vislumbrava angariar fundos para prover a paróquia de recursos financeiros necessários à sua manutenção, bem como edificar as obras físicas sonhadas e idealizadas. E, para tanto, incentivava e incrementava inúmeras atividades sociais, tais como quermesses, barracas, leilões, rifas, sorteios, etc. E quem, pauferrense da década de cinqüenta, não se lembra da rivalidade entre as barracas “vermelha e azul”, com eleição de rainha, leilões disputadíssimos, e, no término, a expectativa de se saber a receita advinda.
Durante o seu vicariato, construiu inúmeras obras físicas, tais como: construção da casa paroquial, do centro social, da Igreja de São Benedito, da Capela 13 de maio, Capela São Geraldo, Patronato Alfredo Fernandes, bem como construção das Igrejas das Cidades de Rafael Fernandes e de Água Nova, pois à época eram distritos de Pau dos Ferros, a exemplo de Marcelino Vieira, Riacho de Santana e Encanto. E a esses distritos o Padre Caminha se deslocava mensalmente para prestar assistência espiritual aos seus habitantes.
Quando a Paróquia de Santo Antonio, da Cidade de Marcelino Vieira, passou a contar com um vigário residente, dispensando, conseqüentemente, a colaboração do Padre Caminha, a população da referida cidade prestou-lhe uma grande homenagem, oportunidade em que o Desembargador Licurgo Nunes, orador oficial da solenidade, dentre outras observações, disse:
“Sempre reputei da maior indispensabilidade – de importância inigualável – a presença – a existência – de um Padre, mesmo nos menores núcleos populacionais.
Aqui, exercera a sua eficiente e devotada pastoreação – às suas periódicas visitações – durante o seu já vintenário paroquiato em Pau dos Ferros – S. Excia o Cônego Manoel Caminha Freire – esse magnífico serventuário do catolicismo – condutor espiritual dos mais aprimorados – inteligência lúcida – cultura privilegiada – artífice das mais deslumbrantes realizações do apostolado cristão, cedido do Ceará – a princípio saudoso, recalcitrante – mas depois e atualmente radicado como qualquer nativo intransigente - pleno de amor terreal, dedicado amigo de tudo e de todos – incapaz de ir-se – no que aliás não consentiríamos.
A esse grande Sacerdote ora rendo o preito de gratidão dos seus ex-paroquianos, concedendo-lhe o exercitamento do seu direito de opção, que receberíamos de bom grado”.
Notívago assumido, sofria de insônia incurável, resultando daí em caminhadas - andanças - noturnas pela cidade, o que lhe proporcionava muitas vezes observar e flagrar comportamento incompatível – inadequado - de alguns paroquianos, o que não deixava passar em branco, advertindo e admoestando o referido paroquiano na primeira oportunidade que se lhe apresentasse – e às vezes o fazia até mesmo no púlpito - e aí mostrava o seu lado irreverente.
Ao tomar conhecimento do falecimento de alguma pessoa da cidade, (a qualquer hora do dia ou da noite – madrugada que fosse, não importava), o Padre Caminha ia imediatamente à Igreja, mais especificamente à sala em que alojava um equipamento de som - “a voz do campanário” - e, sem cerimônia, ligava o referido som - que consistia de duas “bocas” de som - alto falantes - bem potentes, e postados no alto da Igreja Matriz, e anunciava a infausta notícia. Isto precedido , invariavelmente, da “marcha fúnebre” de Chopin – a mais fúnebre de todas as músicas fúnebres existentes. Era um momento lúgubre guardado na memória de todos os pauferrenses que conviveram àquela época. E isto sem se falar no pavor e na apreensão que se instalavam, em todos, quando começavam a ouvir os primeiros acordes da referida marcha fúnebre de Chopin.
Quando não se falava nem se apregoava o respeito à ecologia, bem como o bom trato aos animais, o Padre Caminha, pioneiramente, já o fazia, quando, amparando animais e pássaros, domésticos ou silvestres, mutilados ou abandonados, passava a criá-los em seu quintal, quando chegou a formar um mini-zoológico – atração da meninada de Pau dos Ferros.
Apreciador de um bom charuto, de preferência o cubano, ou mesmo um "Cesário Filho" - sorvia-o lentamente, deliciando todo o seu paladar e aroma agradáveis. Quando o ambiente não permitia fumar charuto, costumava manter a dependência ao tabaco mascando fumo.
Além das funções sacerdotais, exerceu o magistério, sendo Professor, quando ministrou aulas de Português e Francês a turmas do Ginásio 4 de setembro.
No dia 02 de dezembro de 1954 foi nomeado Cônego, em ato da lavra de D. Eliseu Simão Mendes, então Bispo da Diocese de Mossoró. E, em março de 1966, D. Gentil Diniz Barreto, Bispo titular da Diocese, outorgou-lhe a comenda eclesiástica de Monsenhor.
Foi-lhe concedido, pela Câmara Municipal de Pau dos Ferros, através da Lei Municipal de nº 86, de 20 de novembro de 1958, o título de cidadão pauferrense.
Faleceu no dia 09 de julho de 2003, e foi sepultado no jardim direito da Matriz de Nossa Senhora da Conceição. O seu jazigo é visitado diariamente por inúmeras pessoas que vão até lá orar e prestar homenagens a esse Sacerdote que tanto fez por Pau dos Ferros e por seu povo.
Quando do seu falecimento e conseqüente sepultamento houve uma afluência de verdadeira multidão, não só de Pau dos Ferros, como de toda a Região do Alto Oeste. A Cidade parou literalmente. Era o povo – os seus paroquianos – prestando uma última homenagem àquele grande bem-feitor e que durante 50 anos tão bem cuidou e orientou espiritualmente a população de uma região.
Foi decretado luto oficial por três dias em todo o Município de Pau dos Ferros.
A praça existente em frente à casa Paroquial foi denominada de “Praça Monsenhor Caminha”, numa homenagem póstuma muito justa e significativa e na tentativa de perpetuar o seu nome para a história do Município, do Estado e do País.
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