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terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

MASSILON PARTE II


          Galinhas eram postas a engordar num chiqueiro de varas à sombra de árvores, atrás da casa. Não se abatiam galinhas do terreiro. Eram sujas, comiam porcarias, imundícies. Precisavam ficar limpando o chiqueiro. Os guinés não careciam ser confinados, não bicavam sujeiras. Eram ariscos, espantados, dificeis de ser apanhados. Para atraí-los jogava milho no chão, esperava-se que viesse comer e então dava-se o bote, pegando-se os maiores, os machos.
       Madrinha sabia as horas segundo a posição das réstias do sol que penetravam a sala. Almoço e jantar eram servidos por volta das 10 da manhã e 4 da tarde. Ao cair da noite, tio Evaldo chegava para ceia, que variava entre coalhada, jerimum, batata doce e cuscuz com leite que eu comia numa tigelinha de ágata branca. Logo após a ceia íamos dormir. A luz mortiça da lamparina, posta num recanto da sala, dava às nossas noites lugubridade de velório.
    Havia feira aos sábados. Acordava-se mais cedo. A agitação da feira era um hiato naquele viver sem pressa. Vinha gente das fazendas e cidades próximas. Goma boa era de São Miguel e Portalegre. Dos engenhos vinha rapadura nova, clara e cheirosa. As galinhas vivas eram levadas à feira penduradas pelos pés nas extremidas de varas.
        Homens e mulheres a cavalo, a pé, às vezes tangendo animais de carga, enchiam a estrada rumo ao mercado público. Vendia-se farinha em cuis, um recipiente quadrado, de madeira, com capacidade para cinco litros. Antes da compra, o freguês atirava um punhado na boca, para experimentá - la.
        Tio Evaldo tinha mercearia no mercado. O fumo de corda era medido com uma tábua fina e estreita, como régua. O fumo ficava enrolado em cima do balcão, e o matuto só se decidia pela compra depois de cheirá-lo primeiro.
          Madrinha morava ali há muitos anos. Vinha, às vezes, à porta da frente olhar o movimento na estrada. Feirantes saudavam-na, alguns vinham tomar água, café ou tirar uma prosa ligeira.
          A boleira Isaura (Dadá) visitava minha avó todos os sábados. Dava-me pâes-de-ló e sequilhos. Punha o tabuleiro na cabeça, pendurava cestos nas mãos e ia para o mercado, puxando a perna aleijada, vendeer as guloseimas, de que vivia. O tabuleiro balançava com o andar manco, mas não caia, num milagre de equilíbrio. Amanhã continuaremos...

                                              

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